21 setembro 2006

Vôo United 93



Nota: 5

É difícil fazer arte a quente. Pelo menos, boa arte. OK, Picasso pintou Guernica no mesmo ano do bombardeio da cidade basca, durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), mas quantos picassos existirão no cinema atual? Certamente, Paul Greengrass não é um deles, ainda que tenha mostrado saudáveis traços autorais em Domingo Sangrento, docudrama que o colocou no mapa de Hollywood em 2002.

O problema desse Vôo United 93 é o excesso de concessões que faz e as liberdades históricas que toma com um tema que ainda está, por assim dizer, "na boca do povo". Alguns dos problemas:
- Não, não está provado que a revolta dos passageiros tenha sido motivada por heroísmo, e não por instinto de sobrevivência -o que é, aliás, totalmente compreensível, mas pouco "hollywoodiano";
- Não, não está provado que o avião tenha caído como conseqüência da ação dos passageiros, que teriam desconfiado de que ele se dirigia à Casa Branca ou ao Congresso;
- Ainda está para ser esclarecida a hipótese cada vez mais verossímil de que o vice-presidente norte-americano, Dick Cheney, naquele momento dando as cartas do jogo enquanto George W. Bush lia uma história infantil numa escola pública na Flórida, tenha usado as regras de engajamento em vigor e mandado caças abater o avião cheio de civis. Mas o filme é de ficção, e Greengrass poderia ter feito o que quisesse com ele, argumenta você. Poderia, mas não fez: o britânico ouviu as famílias das vítimas e respeitou demais todas as objeções feitas -é gente demais dando palpite na obra alheia. Não que os 111 minutos sejam totalmente perdidos. Greengrass consegue passar sua visão do que deve ter sido o sentimento de claustrofobia e inevitabilidade de alguns passageiros, assim como o caos e o desencontro de informações que dominavam os bastidores do sistema de controle aéreo e as forças de segurança daquele dia. Mas é pouco. Vôo 93 é um filme sobre um momento histórico, mas está longe de ser um filme histórico.