28 fevereiro 2006

Uma Mulher Contra Hitler



Nota: 9

O filme é um relato claro e intenso dos últimos seis dias na vida de Sophie Scholl (nome original do filme), membro da resistência ao regime nazista na Alemanha de 1943. Para fazer o filme, os produtores aproveitaram a descoberta de documentos há muito tempo engavetados nos velhos arquivos da Alemanha Oriental, e de entrevistas recentes com testemunhas ou parentes e amigos dos envolvidos no episódio histórico.

O filme é compreensivelmente estático, já que seu teor se baseia nos interrogatórios de Sophie administrados pelo oficial da Gestapo Robert Mohr. Mas é uma estática elétrica. O filme tem uma energia nervosa no duelo verbal dos dois protagonistas sobre questões de vida e morte.

Interpretações sólidas dos alemães Julia Jentsch como Sophie e de Alexander Held (de "A Queda - Os Últimos Dias de Hitler") como Mohr, em conjunto com um excelente elenco de atores coadjuvantes, garantem que o filme não seja tomado erroneamente por um filme dramático sem vida.

Uma Mulher Contra Hitler teve seu maior impacto, é claro, nos territórios de língua alemã. Mas com o interesse naquela época recentemente avivado por A Queda, o filme também pode ser sucesso em muitos outros países. Na verdade, por tratar de um tema global, que até hoje gera bons filmes e discussões - o nazismo, o filme interessa a todas as pessoas minimamente criticas, que não querem que algo como o nazismo, volte a aparecer. Por isso filmes como esse, servem de alerta, para que práticas e discursos, como os adotados pelos nazistas, que podem muito bem serem vistos nos dias atuais, sejam eliminados da política. Realmente assusta se observarmos os discursos nazistas de mais de cinquenta anos atrás e os compararmos com os discursos dos políticos hoje (leia Bush e Tony Blair). Dizem que o nazismo acabou e que aquele momento (2ª Guerra) apenas maculou a história da humanidade, mas temos que prestar muito atenção na sociedade atual e nos discursos de nossos políticos, pois o nazismo não foi algo isolado à Alemanha e inclusive teve apoio de outras nações "democráticas". Resumindo, é um filme global e atual, que serve para constatarmos certas práticas absurdas dos homens no poder e dos governos eleitos, e para que impossibilitemos a volta dessas práticas.

Sophie pode ser uma grande heroína na história alemã, mas Jentsch a interpreta como o que ela era - uma jovem comum que, em uma época extraordinária, encontra a coragem para fazer o que é certo. Ela e seu irmão Hans (Fabian Hinrichs) são membros da resistência Rosa Branca, um grupo já retratado em outros filmes alemães, principalmente no A Rosa Branca, de Michael Verhoeven.

Uma tola decisão de distribuir panfletos anti-nazistas na Universidade de Munique resulta na prisão de Sophie e de Hans em 18 de fevereiro de 1943. A partir daí, o diretor Marc Rothemund e seu frequente colaborador, o escritor Fred Breinersdorfer, deixam os eventos falarem por si mesmos.

Separada dos outros, Sophie é torturada por Mohr durante horas. Inicialmente, ela nega o envolvimento, e é tão convincente que quase é libertada. Aí aparece uma prova contra ela, encontrada em uma busca no apartamento do irmão. Quando Sophie vê a confissão de seu irmão, ela também admite culpa - e o faz com orgulho. Agora começa a dança verbal de Sophie com Mohr para proteger amigos e colaboradores. Mais tarde, Mohr oferece a Sophie uma chance de receber uma sentença mínima se ela renunciar a seus ideais. Ela recusa.

Mas a parte mais interessante do interrogatório é quando algoz e vítima debatem os objetivos e métodos do governo nazista, e a questão de como a posteridade vai se lembrar dos pontos de vista diferentes de ambos. Mohr era um homem que, em 1943, deveria saber como as coisas estavam indo errado na guerra - que é o ponto principal dos panfletos dos estudantes - e também conhecer as façanhas atrozes do governo nazista. Mas o Mohr de Held não usa expressões de sentido duplo e não aceita o ponto de vista de Sophie.

E ainda assim ele desenvolve uma crescente admiração por ela, e luta para responder algumas de suas questões. Certamente, sua oferta de salvar a vida da moça é curiosa, se ele realmente acredita no que diz que acredita. Pode ser sua última tentativa de ganhar a discussão. E aqui está o valor dramático e moral do filme: o argumento de ambos transcende a época nazista. Tem a ver com a coragem civil, produto em falta mesmo nos dias de hoje .

Rothemund escolheu cenários, figurino e um trabalho de câmera simples, para que o espectador se concentre nos protagonistas e no jogo de palavras. Ele e Breinersdorfer se recusam a sentimentalizar quaisquer decisões de Sophie sobre esses poucos dias. Mas eles mostram sua luta contra a tirania como uma declaração dramática do desejo dos seres humanos por liberdade, não importa qual seja o seu custo.