23 fevereiro 2006

A Pantera Cor-de-Rosa



Nota: 1

A última vez que vimos o inspetor Clouseau, a marca Pantera Cor-de-Rosa passava por momentos difíceis, com o ator (agora diretor de TV) Ted Wass tentando preencher o lugar vago após a morte do formidável Peter Sellers em A Maldição da Pantera Cor-de-Rosa, de 1983.

Esse título também cairia como uma luva neste atual remake, que foi simplesmente chamado de A Pantera Cor-de-Rosa (The Pink Panther) e que finalmente chega aos cinemas nesta sexta-feira após ter sua estréia anunciada diversas vezes.

Mesmo com a inspirada escolha de Steve Martin no papel de Clouseau, o filme é mais desajeitado e atrapalhado do que o desastrado inspetor.

O resultado é dolorosamente sem graça - algumas exceções, como uma mordida num "hambúrguer", já começam a perder a graça devido à propaganda. E mesmo com o acréscimo da tentadora cantora Beyounce, há um gosto de requentado em toda a produção.

Embora Martin e o diretor Shawn Levy tenham trabalhado juntos antes no primeiro remake de Doze é Demais, eles não conseguem fazer as tiradas cômicas necessárias.

O resultado desperdiça uma série de talentos, incluindo o de Kevin Kline como o pomposo superior de Clouseau e Jean Reno como o estóico assistente do inspetor, além de Emily Mortimer e Kristin Chenoweth. Apesar de ser filmado em Nova York, Paris e Praga, o filme poderia muito bem ter sido rodado todo em estúdio.

Para alguns, Pantera Cor-de-Rosa foi um personagem de desenhos animados produzidos até a década de 90. Para outros, trata-se do valioso diamante cobiçado pelo ladrão de codinome Fantasma até os anos 80. Agora, as novas gerações recebem uma outra interpretação para a franquia, muito fraca, sem graça, enfadonha, maçante e ridícula em muitos momentos.

A nova versão pouco tem a ver com a história filmada por Blake Edwards, em 1963, que lançou a Pantera Cor-de-Rosa para o mundo e inspirou a criação do personagem rosado mais famoso da TV. Na verdade, apenas o inspetor e o diamante foram trazidos para este novo filme. Ao que parece, o humor também preferiu ficar no passado. Onde está o humor? Nem Clouseau acha.

Jacques Clouseau (Steve Martin), um desprestigiado inspetor francês, recebe o caso mais importante de sua carreira. Ele precisa descobrir quem é o assassino do famoso treinador de futebol Yves Gluant (Jason Statham), e o mais importante: quem roubou a valiosa jóia de Gluant, conhecida como Pantera Cor-de-Rosa.

A morte acontece após uma partida entre a França e a China (numa cena forçada, e mais produto de merchandising, do que qualquer outra coisa). Da cena do crime restaram apenas um dardo envenenado, a sexy e famosa esposa do treinador (Beyoncé Knowles), o ex-namorado da moça (William Abadie) e alguns desafetos chineses.

Resolver esse caso significa receber a cobiçada Medalha de Honra, muito almejada pelo inspetor chefe Dreyfus (Kevin Kline), que apenas escala o desastrado Clouseau a fim de ter o caminho livre para resolver o caso e levar as glórias.

O diretor Shawn Levy foca no público apreciador de humor mais físico e menos verbal. Não há pessoa ou objeto que passem ilesos pela falta de habilidade de Clouseau. Quedas, pancadas e esbarrões se repetem para preencher os 93 minutos de fita.

Steve Martin, cabelos brancos, bigode negro à la comédia pastelão, dá um novo tom ao Clouseau imortalizado por Peter Sellers a partir da década de 60. Seu personagem monopoliza a tela e, mesmo rendendo algumas risadas, torna a trama limitada. Martin também é responsável pelo roteiro do filme.

Como um protagonista trapalhão não pode deixar de ter seus escudeiros, o eterno tipo francês Jean Reno faz a vez do sóbrio Gilbert Porton. Emily Mortimer ( do recente Ponto Final) é a secretária Nicole. Para a atriz, foi "assustador" fazer a personagem. "Contar uma piada da qual ninguém ri em um cinema é muito mais vergonhoso que estar em um palco", disse Emily.

Já Beyoncé encontra sérias dificuldades em fazer o papel de... Beyoncé. Sua personagem, "Xania", deveria encarnar a "popstar, milionária e sedutora". Mas a texana parece ter entrado em crise de identidade durante as filmagens. "Em muitas cenas com Steve foi realmente difícil ficar no personagem, porque ele era tão engraçado e eu nunca sabia o que ele ia fazer", justificou a cantora, após a produção. O único instante em que a ex-Destiny's Child está confortável acontece numa apresentação musical - curiosamente, é no momento em que o filme fica parecido a um clipe de música pop.

Pantera Cor-de-Rosa é um caso comum da indústria cinematográfica. Sua música tema faz mais sucesso do que a própria história. A composição, de Henry Mancini (1924-1994), tornou-se um dos sons mais requisitados para toques de celular - um sinal de nossos tempos.

Da apresentação do cast à última cena do filme, a canção surge em todos ritmos imagináveis. Lá pelas tantas, o que antes soava simpático começa a cansar. Qualquer semelhança com as piadas não é mera coincidência.

Bem provável que, ao sair da sala, o espectador saque seu celular e troque de ringtone para a 5ª Sinfonia de Beethoven ou fique com aquela da corrida de cavalos ("William Tell Overture", de Rossini).