22 julho 2005

Exílios



Nota: 7

Todo filme-de-estrada que se preze funciona como uma jornada de auto-conhecimento. E começa, de preferência, ilustrando o que o viajante deixará para trás caso decida mesmo entrar nesse rito de instrospecção mundo afora.

No caso de Exílios (Exils, 2004), essa introdução é curta, não tem mais do que dez minutos - afinal, nada prende Zano (Romain Duris, de Albergue espanhol) e Naïma (Lubna Azabal) a Paris. Os dois são como estrangeiros por lá: descendentes de argelinos, cresceram na França quando seus pais fugiram da ex-colônia francesa durante a Guerra da Argélia (1954-1962). Agora Zano e Naïma resolvem, depois de uma transa e uma cerveja à tarde, viajar até o país natal de que mal se lembram.

Na verdade, há um elemento aparentemente banal que Zano deixará para trás: o violino que foi de seu pai. A cena em que ele quebra um muro e cimenta o instrumento entre o vão de tijolos é emblemática do que esperar do filme.

O roteiro escolhido nessa viagem meio cigana, meio mochileira, também diz muito das intenções do cineasta franco-argelino Tony Gatlif, que com este longa ganhou o prêmio de melhor diretor em Cannes em 2004. A trilha - sonora e geográfica - segue por Espanha e Marrocos, onde a cultura étnica se impregna de peculiaridades musicais. Zano e Naïma carregam somente algum dinheiro, alguma roupa e fones de ouvido. Taí outra dica do que vem a seguir: os dois escutam música eletrônica por onde andam, mas os sons sintetizados refletem a falta completa de raízes dos dois.

Não é a toa que o casal se deslumbre a cada parada, seja com o bailado apaixonado do flamenco ou com o ritual hipnotizante dos tambores árabes. Eles estão à procura de se identificar com algo, e não há muita coisa mais genuína numa sociedade do que o ritual da dança. Muitos dos números desse quase-musical foram extraídos do cancioneiro mediterrâneo, enquanto outros foram compostos pelo próprio diretor.

Entre uma música e outra, Zano e Naïma experimentam a regressão. Com o pé na estrada, à medida que se distanciam de Paris e conhecem o desconhecido, entram numa espécie de purificação. Banham-se numa fonte, entregam-se à chuva... A certa altura, precisam trabalhar num pomar para conseguir algum dinheiro. Não é difícil prever que eles transarão sob a sombra da árvore e comerão do cacho que deveriam colher: é o primitivismo no auge, chegando até Adão, Eva e o fruto proibido do Éden.

Acontece que a busca pela essência interior, por um mínimo sentido de pátria, não é a mesma dele e dela, pois suas histórias são distintas. Não sabíamos disso naquela breve introdução, mas a trama cuida de explicar aos poucos. Zano guarda fotografias de seu pai. Na verdade, procura a Argélia para reanimar sua memória. Naïma não. Vai à terra natal justamente para tentar expurgar suas lembranças. Por ser mais dramática, a jornada feminina mostrada por Gatlif sai muito melhor. A outra, porém, sofre com as limitações do ator Duris e não vai muito além do turismo musical.