09 maio 2005

Cruzada



Nota: 4

Ridley Scott queria fazer um filme de ação sobre as Cruzadas, com visuais arrebatadores - não um documentário. Ao ser anunciado, o filme fez levantarem algumas sobrancelhas. É delicadíssimo mostrar a invasão de encrenqueiros ocidentais ao Oriente Médio hoje em dia. Afinal, isso está acontecendo neste exato momento, quase 1000 anos depois da Primeira Cruzada. Os motivos, tanto os "oficiais" quanto os velados, continuam os mesmos: liberdade e riquezas, respectivamente. E viva a evolução da humanidade!

Desde sua concepção, o épico resultante, que custou 140 milhões de dólares, despertou controvérsias em torno do relato fictício que faz da batalha secular travada entre cristãos e muçulmanos pelo controle da Terra Santa do Oriente Médio. Acadêmicos contestaram a maneira como o filme retrata fatos históricos, e muçulmanos e cristãos disseram temer que o filme retrate seus antepassados de maneira injusta.

O diretor sofreu ameaças de morte enquanto filmava no Marrocos, e um historiador afirmou que o roteirista do filme, William Monahan, copiou elementos de seu livro sem autorização. Diretor do premiado com o Oscar Gladiador, Scott afirma que encontrou um bom ponto de equilíbrio em seu filme. Cruzada é um épico repleto de sangue e batalhas e entremeado com uma história de amor em estilo hollywoodiano. O protagonista da história é Orlando Bloom (fraquinho) no papel de um herói relutante chamado Balian que, após a morte de sua mulher, parte para lutar nas Cruzadas.

As Cruzadas foram expedições organizadas pela nobreza européia, com o aval da Igreja, para libertar a Terra Santa do domínio dos árabes. Estes haviam se convertido ao Islã e uma de suas tribos ocupara a Mesopotâmia, a Síria, a Palestina e parte da Ásia Menor, proibindo as peregrinações de cristãos. Para “salvar” a Europa Oriental e a Terra Santa, o Papa Urbano II convocou os nobres europeus baseado em dezenas de falsas alegações (seria ele um antepassado de George W. Bush?), dando origem em 1095 à 1ª Cruzada.

Quatro anos mais tarde, em 15 de julho de 1099, a cidade de Jerusalém cai sob o poderio cruzado. A população muçulmana e judia é massacrada. Setenta anos de conflitos se seguem até que surge Saladino (1137-93), sultão que consegue unificar o Povo do Crescente e reúne um vasto poderio militar. Sua habilidade na guerra, diplomacia e honra com amigos e inimigos se tornam lendárias. É nessa época que é assinada uma trégua entre ele e Balduíno IV, o leproso (1174-1185), regente de Jerusalém que acreditava que todas as religiões deveriam ser bem-vindas à cidade sagrada para rezar. Mas a saúde precária do rei tornava a trégua frágil... e aqui começa a aventura de Ridley Scott.

Balian aparece em Jerusalém no final do século 12, quando a cidade santa era governada pelo rei cristão Balduíno IV. Mas Balduíno é leproso e está às portas da morte. Os nobres cristãos - especialmente o líder dos Cavaleiros Templários, Guy de Lusignan - estão tramando para sucedê-lo.

Quando os homens de De Lusignan atacam um comboio muçulmano, tem início o cerco de Jerusalém pelo exército de 200 mil homens do líder muçulmano Saladino (Ghassan Massoud). Balian lidera a defesa de Jerusalém, mas se vê em desvantagem e se rende a Saladino. Balduíno e Saladino são mostrados como governantes sábios, embora sempre dispostos a matar. De Lusignan é retratado como sanguinário, e Balian, quando sente sua fé balançar, segue seu próprio norte moral e consequentemente, norte-americano.

Todos os principais personagens da película realmente existiram, mas a exemplo do que fez em Gladiador, Scott mistura fatos históricos, datas e inclui personagens fictícios na trama. Sempre à sombra do General Maximus, o diretor repete planos e clichês exaustivamente. A chegada de Balian de Ibelin à Jerusalém, por exemplo, é cópia carbono da entrada do personagem de Russel Crowe em Roma no filme de 2000. As batalhas também usam os mesmos artifícios: cortes velocíssimos, câmera tremida, muita terra e sangue no ar. A grande diferenciação acontece mesmo na batalha de Hittin (1187), que culmina no cerco às muralhas de Jerusalém, mas aí tudo parece demais com O Senhor dos Anéis. Isso sem contar os discursos heróicos que encharcam esse tipo de produção, que também escorrem aos borbotões. Ou seja, clichê atrás de clichê.

Incomoda também o fato do simples ferreiro, sem qualquer treinamento formal, ser capaz de manobras de guerra dignas de um Eisenhower. Eva Green (a Isabelle de Os Sonhadores) mais bela do que nunca como Sybilla, a princesa irmã de Baduíno IV, também se esforça, mas a história de amor que ela protagoniza - obrigatória em Hollywood - resulta dispensável.