02 fevereiro 2006

Paradise Now



Nota: 9

Ao acompanharmos as notícias sobre os conflitos entre judeus e muçulmanos na região de Israel que envolvem os famigerados homens-bomba, imediatamente nos questionamos sobre os motivos que levam alguém a explodir-se por uma causa.

"Fanatismo" é a primeira palavra que vem à cabeça, geralmente seguida por imagens estereotipadas de osamas-bin-ladens genéricos, segurando explosivos numa mão e uma AK-47 na outra, enquanto gritam "Alá" e pressionam o botão da bomba. Paradise Now (2005), filme do israelense Hany Abu-Assad, acaba com tudo isso.

Assad escolheu uma forma interessante de abordar o conflito, quase que exclusivamente visto pelos olhos endinheirados dos israelenses judeus: através do ponto de vista dos próprios homens-bomba. Não se trata, no entanto, de um filme que promove o ódio. Pelo contrário. Tenta explicar como pessoas tão normais quanto você e eu podem sujeitar-se ao martírio.

Na trama, Said (Kais Nashef) e Khaled (Ali Suliman) são dois palestinos amigos de infância, escolhidos, quase que sem aviso, para um ataque suicida. Eles aguardavam sua hora há vários anos e, quando ela chega, ambos têm tempo apenas para passar a última noite com as respectivas famílias. Mas seus instrutores terroristas avisam que ninguém pode desconfiar do fato. Assim, os agradecimentos são deixados para um vídeo. Durante suas últimas horas de vida, os rapazes mudam de sentimentos e intenções algumas vezes. Um aceita de imediato e fica muito feliz com a tarefa recebida (um presente de Alá), mas depois mergulha em dúvidas sobre a ação. Já o outro, filho de um colaborador executado como traidor, não pretendia perder a vida tão cedo, mas depois não hesita em seguir seu destino.

A produção não toma partido, mas mostra que a causa terrorista está ultrapassada. Retrata os suicidas com humanidade, mas introduz personagens que os fazem pensar, como Suha (Lubna Azabal) uma ativista da luta pacífica que percebe o que vai acontecer e tenta dissuadi-los debatendo. Ela é filha de um famoso suicida, que depois da morte do pai, vai morar na Europa, conhecendo outras realidades, outras vidas. Seu ponto de vista é meio ocidental, meio bom senso, enquanto que os rapazes acabam sendo mostrados como jovens ignorantes. Eles não sabem o que fazem, as lideranças escolhem por eles seu destino, e a palestina-ocidentalizada acaba sendo a voz da sabedoria, que diz que isso não leva a nada. Importante também é a figura da mãe de Said (a maravilhosa Hiam Abbass, de A noiva da Síria e Free Zone), que dá ao filho uma nova visão sobre os chamados "traidores". O filme não mostra os suicidas como pessoas loucas, más, mas mostra-os como pessoas comuns, que tem boas intenções, (acabar com o colonialismo judeu sobre a palestina) mas que são usadas por terceiros.

Algumas imagens são especialmente emblemáticas na produção. Partindo da pequena e devastada cidade fronteiriça de Nablus, com fachadas e edifícios destruídos, Said e Khaled chegam à moderna metrópole de Tel Aviv para cumprir sua missão. De dentro do automóvel que os transporta, observam pessoas inocentes nas praias e ruas. O contraste das ruas destruidas e da vida pobre dos palestinos, com a riqueza e a ocidentalização dos judeus, é muito forte. É algo que nos faz pensar. Impossível demonizar seu inimigo assim de tão perto.

Um pequeno e poderoso filme, que prova que libelos pacifistas podem vir das fontes mais improváveis possíveis. Afinal, criatividade é necessária para mudar este planeta e a imagem da pombinha branca já deu no saco. Prega a paz sem demonizar o tradicional inimigo e sem impor suas condições.