A Luta Pela Esperança
Nota: 8
A história de James J. Braddock era um convite aberto para ser transformado em filme. Durante a década de 1920, ele foi um lutador de certo renome na categoria meio-pesado e dono de uma poderosa direita. Mas em 18 de julho de 1929 perdeu para Tommy Loughram por pontos após 15 assaltos. O dinheiro que tinha conseguido juntar, Braddock investiu em ações e em uma companhia de táxis. Em setembro do mesmo ano, ele e quase todo o povo norte-americano foi a nocaute com a queda da bolsa. Vieram a grande depressão, o desemprego, a fome, a pobreza.
O grande trunfo do diretor Ron Howard e Russel Crowe - reeditando a dupla de Uma Mente Brilhante - é conseguir mostrar todo o desespero de Braddock (Crowe) e seus conterrâneos em A Luta Pela Esperança (Cinderella Man, 2005). Mais do que um filme sobre um boxeador que conseguiu ressurgir no esporte após uma série de reveses, o longa é um drama sobre uma das mais duras fases da poderosa economia dos Estados Unidos.
O apelido de "Homem Cinderella" foi criado pelo cronista esportivo Damon Runyon e resume bem o conto de fadas pelo qual Braddock e sua família passaram. Durante seus dias de desespero, Braddock e sua esposa, Mae, se mudaram com seus três filhos da confortável casa no subúrbio de New Jersey para um cortiço. Não havia comida suficiente para alimentar seus filhos, o pouco leite que restava era misturado com água para render e, em pleno inverno, não havia dinheiro sequer para o aquecimento. Braddock engoliu seu orgulho, utilizou a ajuda do governo e - em uma das mais emocionantes cenas do filme - foi mendigar. Tudo isso para manter sua família unida e seus filhos longe da delinqüência.
Sua sorte começou a mudar quando conseguiu a chance de disputar uma última luta no Madison Square Garden. A bolsa era pequena, mas suficiente para quitar algumas dívidas. Sem o peso da responsabilidade e com uma nova arma secreta, ele consegue uma improvável vitória e assim ganha a chance de novas lutas, até conseguir a chance de disputar o título mundial dos pesos-pesados contra Max Baer - dono de um cartel invejável e responsável pela morte de dois adversários, que tiveram seus cérebros descolados após receberem seus potentes golpes.
As lutas são sempre muito tensas, mas em não inovadores no gênero. A câmera do diretor de fotografia Salvatore Totino (Um Domingo Qualquer) coloca o público dentro do ringue, levando e acertando socos junto com os pugilistas. Tecnicamente, destacam-se também a trilha sonora de Thomas Newman, que faz muita referência às raízes irlandesas de Braddock, o desenho de produção de Wynn Thomas e os figurinos de Daniel Orlandi, que ajudam a situar o público no tempo e espaço.
As atuações de Russel Crowe como Braddock e Paul Giamatti como seu empresário Joe Gould mostram mais uma vez o alto nível dos dois. Para interpretar o lutador, Crowe perdeu 23 quilos treinando duro sob a supervisão de Angelo Dundee, que em outros tempos foi técnico do Muhamad Ali, Sugar Ray Leonard e até do nosso Maguila - na época em que se sonhava de uma luta do brasileiro contra Mike Tyson. Vale destacar também o grandalhão Craig Bierko, que interpreta Baer. Como em todo conto de fadas é necessário um vilão, os roteiristas erraram ao retratar Baer e cometeram injustiça histórica. É na passagem em que o campeão afirma que consolará a mulher de Braddock depois de matá-lo - alusão ao fato de um rival de Baer ter morrido após o castigo que recebeu no ringue. Baer ficou conhecido como playboy, mais interessado em festas. No entanto, seria incapaz de tais atos de crueldade. Tal liberdade não é novidade em filmes do gênero. Hurricane, por exemplo, dá a entender que Rubin Carter só não foi campeão porque foi roubado.
A luta de um homem comum, que passou pelo pior, conseguiu superar as barreiras e se reerguer é o resumo de tudo o que Hollywood sempre quer mostrar. Mas não imagine os dramas baratos, cheios de redundâncias que se vê por aí. Howard é mais cuidadoso. Ele conhece bem o público para quem fala e explica - apenas uma vez, mas de forma bastante didática - a real motivação que mantém Braddock de pé mesmo depois de tanta porrada: ele não lutava pelo amor ao esporte, mas sim contra a pobreza e foi isso que o tornou um exemplo para tanta gente.
Mas quem for ao cinema esperando outro Menina de Ouro sairá decepcionado. A Luta é edificante, mais leve e não tão denso dramaticamente, apesar das cenas de miséria (que diga-se de passagem, lembram e muito a miséria que temos no Brasil hoje em dia).
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