O Castelo Animado
Nota: 9,5
Sofisticado e inteligente, O castelo animado (Hauru No Ugoku Shiro, 2004) é mais um triunfante longa-metragem de Hayao Miyazaki, dono de um Oscar por A Viagem de Chihiro e criador de clássicos como Princesa Mononoke (que permanece estupidamente inédito no Brasil), Meu Amigo Totoro e Porco Rosso, entre tantos outros.
Conhecido pelas personagens femininas fortes - apesar de jovens -, fascinantes criaturas e belíssimos cenários surrealistas, Miyazaki coloca um novo e relevante elemento em O Castelo Animado: um manifesto contra a guerra. A industrialização desenfreada já havia sido duramente combatida no ecológico Princesa Mononoke, mas agora o cineasta japonês aponta seus holofotes criativos aos conflitos mundiais.
A crítica é realizada com o bom-humor habitual, mas com um visão um tanto mais sombria que sua produção passada, graças à seriedade do tema. Guerras em larga escala entre feiticeiros e impressionantes máquinas de destruição desfilam pela telona, mas há espaço também para o alívio cômico - seja ele um cãozinho asmático ou um garotinho disfarçado de ancião. Miyazaki faz pensar, mas também dá espaço ao sorriso.
Como se o roteiro inteligente não fosse suficiente, a produção dá também um tapa na cara de quem acredita que a animação tradicional está morta e enterrada. A computação gráfica é utilizada apenas para as cenas que seriam caras demais para serem animadas da maneira convencional, mas o grosso do filme é mesmo desenhado manualmente (e boa parte dela pelo diretor japonês de 64 anos!).
A idéia básica do filme trata de um feiticeiro errante, Howl, e sua rebeldia em deixar-se arrastar para a guerra. Mas entrelaçadas aí estão as histórias de uma jovem vítima de um feitiço de envelhecimento, a rivalidade entre duas bruxas e o destino de um pequeno, mas poderoso, demônio do fogo, Calcifer. Miyazaki desenvolve com habilidade cada um desses personagens e nos mostra todas as suas facetas, revelando corações e almas como poucos filmes - animados ou não - conseguem. Sob a batuta desse mestre a animação japonesa encontra outra vez o realismo fantástico e o surrealismo. Eventos decisivos na Segunda Guerra Mundial, como os bombardeios a Londres e Pearl Harbor, ocorrem num mundo em que Howl se esconde em um castelo com pés de galinha, por exemplo. É justamente esse poder narrativo que seduz o espectador, desejoso de conhecer as sutilezas e motivações de todos.
A história é adaptada do romance de fantasia da escritora britânica Diana Wynne Jones e foi um avassalador sucesso no Japão, onde as obras do diretor são reverenciadas e não param de se superar. Nos Estados Unidos fez apenas uma fração do que o mais estúpido dos desenhos animados costuma gerar. Algo lamentável, se considerarmos que as crianças que mais precisavam ter lições sobre humanidade e entendimento são justamente as que menos se interessam por elas. Mas é algo até fácil de ser entendido, já que mercadologicamente O castelo animado foi considerado inteligente demais para o grande público estadunidense já que, como na vida, ele não traz distinção clara entre o Bem e o Mal, entre outros aspectos que exigem atenção.
Mas antes que você pense que por aqui a coisa é muito diferente, saiba que Chihiro estreou por aqui atrás do Didi: O Cupido Trapalhão, As Panteras Detonando e até de Cruzeiro das Loucas. Aparentemente, também temos muito o que aprender... Que tal ajudar a mudar esse quadro?
É um belíssimo filme, uma verdadeira obra de arte, com uma mensagem riquíssima. Se as crianças fossem educadas dessa forma no ocidente, se elas não fossem tratadas como mero consumidores mirins, talvez a realidade fosse outra por esses lados do oceano.
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