21 janeiro 2005

Casa dos Bebês



Nota: 6

A gravidez é uma dádiva, mas pode ser também uma maldição. Este é um dos temas utilizados pelo diretor, roteirista e montador John Sayles em seu novo filme, Casa dos bebês (Casa de los babys, 2003). A história se passa em um país não definido da América Latina e mostra o drama de seis mulheres estrangeiras que chegam do rico Estados Unidos com uma missão simples: voltar para casa com um nenê nos braços.

Cada uma com seus problemas passados e atuais, as seis esperam a burocracia local legalizar seus pedidos de adoção morando no mesmo hotel. Comandado pela señora Muñoz (Rita Moreno), o lugar é conhecido pelos nativos como "Casa de los babys", assim, com erro mesmo, afinal estamos falando de um povo sem cultura e pobre, que acorda antes do sol nascer para descer o morro e ir trabalhar para os burgueses. Uma destas proletárias é Asunción (Vanessa Martinez), que trabalha na Casa como arrumadeira dos quartos, e faz de tudo para cuidar de seus irmãos mais novos.

Num lugar com tantas desigualdades sociais, é possível ver meninos de rua que passam o dia arquitetando pequenos golpes e cheirando spray, e uma mãe que planeja levar sua filha adolescente, grávida, para Miami e assim não correr o risco de ficar mal falada.

Sayles foi audacioso ao criar um país cujo principal produto exportador são justamente os bebês, afinal, se esta (ainda) não é a principal fonte de renda de nenhum país do terceiro mundo, é impossível negar que este tráfico existe. Outro ato de coragem do cineasta foi reunir um elenco grande, estrelado e criar uma história sem protagonistas. O que une os personagens não é esta ou aquela pessoa, mas sim o tema central: ser mãe. Ou seria o capitalismo?

A verdade é que ao não se aprofundar em nenhum dos personagens, ao não contar uma história com finais conclusivos, Sayles dá a chance do espectador sair da sua confortável posição passiva e pensar. O que acontecerá com aquele homem que, desempregado, sonha em se mudar para a Filadélfia, um lugar que ele chama de "o berço da liberdade"? É interessante imaginar também o que vai acontecer quando Jennifer (Maggie Gyllenhaal), cujo casamento está por um fio, conseguir seu filho. Ou então como serão as vidas da ex-alcóolatra Gayle (Mary Steenburgen) e da solteirona independente Leslie (Lili Taylor). Será que Skipper (Daryl Hannah) vai ser a mãe perfeita que ela tanto sonha, ou sua paranóia com a ginástica vai atrapalhar esta nova fase? E como a malvada e já cheia de problemas Nan (Marcia Gay Harden - ótima) vai dar amor ao seu bebê se ela própria parece não saber o significado deste sentimento? Os sonhos e dúvidas expostos no "diálogo" que a irlandesa Eileen (Susan Lynch) tem com Asunción são a síntese de tudo o que se sonha sobre ser mãe (ou pai) e do que se espera para seu filho(a).

Mesmo contando com atrizes de certo renome em Hollywood, o filme é considerado independente, pois seu orçamento ficou em torno de 1 milhão de dólares e sua exibição foi praticamente restrita a festivais e circuitos alternativos. E é justamente esta independência que o torna interessante. Nestes dias em que projetos pejorativos sobre países de terceiro mundo, como Chamas da Vingança, teimam em aparecer nos cinemas, chega a ser um enorme alívio ver fitas que tratam a realidade com um olhar livre de clichês. Faz bem para a alma ver que há, sim, inteligência no cinema norte-americano, que há, sim, vida inteligente nos Estados Unidos. Não acredita? Então entre no site www.sorryeverybody.com e veja com seus próprios olhos.