A Rainha
Nota: 2
Dez anos após a morte de Lady Di em um acidente de carro em Paris, o filme britânico A Rainha, de Stephen Frears, relembra a verdadeira crise política aberta na Inglaterra devido à inabilidade com que, a princípio, a família real lidou com a incrível popularidade da princesa morta.
A atriz Helen Mirren, que interpreta a rainha Elizabeth II, cumpre seu papel com maestria. Vencedora do Globo de Ouro neste ano por este papel, ela também concorre ao Oscar de melhor atriz.
Esta é uma das seis indicações de A Rainha, que disputa também a estatueta em outras categorias muito cobiçadas: melhor filme, melhor diretor, melhor roteiro original (Peter Morgan), melhor figurino (Consolata Boyle) e melhor música (Alexandre Desplat).
Um dos aspectos mais interessantes da história é retratar personagens reais e vivos atualmente, caso da rainha e também do primeiro-ministro Tony Blair (interpretado por Michael Sheen, que viveu o mesmo personagem num filme para a TV inglesa, The Deal, de 2003, também dirigido por Frears e escrito por Morgan, parceiros em A Rainha). Sheen, aliás, parece-se inclusive fisicamente com Blair, assim como a atriz que interpreta sua esposa Cherie, Helen McCrory.
O filme mostra membros da família real fazendo comentários cínicos sobre a morte da princesa. A princesa Margaret, por exemplo, diz à irmã e rainha, quando tem de interromper suas férias na Toscana por causa do funeral, que "até depois de morta Diana cria problemas".
Em todo caso, é fato comprovado que a família real resistiu muito a fazer qualquer comentário ou mesmo a organizar um funeral público para aquela que, mesmo divorciada do príncipe Charles (Alex Jennings), é mãe de dois príncipes herdeiros.
Quando fica sabendo que Diana morreu, a rainha não faz qualquer declaração, não se move de sua residência de férias nem manda hastear nenhuma bandeira no Palácio de Buckingham - diante de cujos portões toneladas de ramalhetes de flores se acumulavam a cada dia, demonstrando a dor que a população inglesa sentia com a morte da princesa.
A rápida compreensão do sentimento do povo mostra-se a primeira grande oportunidade do primeiro-ministro Tony Blair, novo no cargo, de marcar pontos para sua própria popularidade. Bem-orientado por seu assessor de imprensa, que inventa a expressão "princesa do povo" para um dos discursos de Blair, o primeiro-ministro sai fortalecido do episódio.
Sentindo-se forte diante da rainha, que o trata com bastante frieza, Blair acha que é seu dever alertá-la sobre o perigo que pesa sobre a imagem da monarquia caso insista em ignorar a dor do povo por Diana. Isto acaba mudando mesmo a atitude da família real, que a contragosto organiza um funeral público, mais uma vez um grande evento coberto pela mídia, como tudo o que dizia respeito à Diana.
Este é o grande eixo do filme: a disputa velada de poder entre Blair e a soberana e o conflito entre modernidade e tradição na família real.
O roteiro de Peter Morgan mostra inteligência e ironia para explorar bem mais do que isso, apesar de não questionar o núcleo duro do poder. No final das contas, tanto a rainha, quanto o primeiro-ministro, saem com as imagens intactas do embate. Eles superaram suas falhas, suas fraquezas, seus traumas, e deram a volta por cima. Nada mais Hollywoodiano. A rainha, que já viu passar outros dez primeiros-ministros pelo cargo, sabe o quanto a sua lua-de-mel com o povo pode ser breve e deixa isso claro a Blair durante um encontro.
Nada mais profético já que, depois de três mandatos, o primeiro-ministro, que caiu em desgraça diante da opinião pública inglesa, agora prepara-se mesmo para sair. Enquanto a rainha, claro, continua como sempre em seu trono.
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