04 dezembro 2006

A Fonte da Vida



Nota: 8

A Fonte da Vida
(The Fountain, 2006) do talentoso cineasta Darren Aronofsky (Pi, Requiem Para um Sonho) desperta reações de amor e ódio. O projeto levou cinco anos para sair do papel e teve problemas a partir da pré-produção. Brad Pitt abandonou as filmagens por diferenças criativas com o diretor e foi naufragar em Tróia. Por conta disso, Cate Blanchett também saiu e o orçamento de 75 milhões de dólares foi reduzido para 35 milhões. Todavia, mesmo com todos esses percalços, o filme é brilhante. Um lindo poema sobre o amor entre duas pessoas e a aceitação da morte como parte da evolução e da vida.

A história foi escrita por Ari Handel e Aronofsky e produz enorme reflexão ao final da sessão, aqueles momentos únicos que só o cinema de qualidade consegue proporcionar. Não apenas as imagens, mas os temas e idéias permanecem na memória por dias. A narrativa é complexa, mas não é difícil de entender, basta querer pensar.

Nela, Hugh Jackman é Tommy Creo, um cientista que está em busca da cura do câncer. Para ele é pessoal, já que Izzi (Rachel Weisz), sua esposa, esta morrendo com um tumor cerebral. A chance de sucesso chega juntamente com seu time de pesquisadores, que traz uma amostra de uma árvore singular das selvas da América do Sul. A planta pode ser a cura que ele tanto busca. Enquanto isso, Izzi escreve um livro sobre um conquistador (também interpretado por Jackman) que viaja para o Novo Mundo em busca da Árvore da Vida a pedido da rainha Isabel (também interpretada por Weisz). A terceira parte da história é passada no futuro, quando o cientista (ainda Jackman) viaja pelo espaço.

Pode parecer complicado, mas, ao final, algumas peças do quebra-cabeça se encaixam. Outras ficam inteligentemente vagas e cabe ao espectador (tentar) decifrá-las. Dessa forma, não há uma solução definitiva para o filme, já que seu entendimento em muito se deve às crenças e experiências da cada um.

O tema é conceitualmente denso e ao mesmo tempo rico emocionalmente. Da mesma forma que 2001 – Uma Odisséia no Espaço (1968), do lendário cineasta Stanley Kubrick, provoca uma reflexão sobre a vida, a morte e a existência, A Fonte da Vida trilha um caminho parecido. Mas o combustível de Aronofsky é o amor.

Filosofias à parte, os saltos cronológicos do longa são apenas variações psicológicas do tema. Só o presente realmente esta acontecendo. As outras épocas ajudam a preencher algumas lacunas da história, mas a trama pode ser analisada de forma cartesiana através dos detalhes, como as tatuagens no braço do protagonista. O recurso dá espaço de sobra para que teorias sejam formuladas e essa é a brilhante proposta do cineasta. É fantástico que ainda existam diretores que procuram criar algo mais do que simples entretenimento.

Em relação as atuações, o filme também é um achado. Hugh Jackman (X-Men) revela um lado não conhecido pelo grande público. Ele é carismático. Já provou que sabe cantar e dançar (na Broadway ano passado) e aqui surpreende com uma interpretação emocionalmente devastadora. Conseguimos sentir sua essência em cada gesto e olhar. Suas cenas como o conquistador são boas. As do presente são tocantes e comoventes. As do futuro são brilhantes e complicadíssimas, já que ele está sozinho e consegue ser ao mesmo tempo um lunático, uma alma perdida, um Buda.

Rachel Weisz (O Jardineiro Fiel) não fica atrás. Ela interpreta sua personagem que irá morrer sem os habituais clichês. A atriz proporciona níveis de complexidade, camadas de medo e aceitação, no pequeno espaço de tempo em que aparece. Ela tem olhos lindos e os usa para contar a sua história, registrada de maneira apaixonada pelo diretor - até porque eles são casados - e ele aproveita o tema para mostrar todo seu sentimento por ela.

Todo esse carinho ajudou na concepção de cenas belíssimas. Os recursos reduzidos não impediram Darren de ser criativo. Os efeitos especiais foram filmados num laboratório por meio de experiências químicas. Podemos até notar várias influências de Pi, seu primeiro filme. Temas como a busca incansável e a obsessão reaparecem. A diferença está na montagem. Se antes ela era picotada e com efeitos, agora Darren equilibra os cortes com sons para dar um compasso sutil ao filme. Tudo isso embalado numa trilha sonora hipnótica, escrita por Clint Mansell no estilo de Phillip Glass.

Definitivamente o filme não foi feito para ser exibido em multiplexes e muita gente deve sair revoltada do cinema, como aconteceu em festivais por aí. Mas quem consegue se despir de preconceitos e busca no cinema algo diferente, será recompensado com uma viagem inesquecível.