Motoqueiro Fantasma
Nota: 2
Faltou combustível para transformar o filme do herói da Marvel numa aventura à altura do personagem
Lembra-se de quando a notícia de que estavam levando um personagem dos quadrinhos para a telona deixava todos os fãs empolgados? Bem, graças a filmes como este Motoqueiro Fantasma (Ghost Rider, 2007), já começamos a receber esse tipo de notícia com uma certa desconfiança. E pensar que o pobre Nicolas Cage, que tenta há anos interpretar um personagem de quadrinhos (ele quase foi o Superman, ficou interessado no Homem de Ferro e queria adaptar Hard Boiled – À Queima-Roupa, entre outros), foi acabar num filme que, infelizmente, deixa muito a desejar.
O filme começa de forma interessante, mostrando um caubói que, 150 anos atrás, carregava a mesma maldição que irá recair mais tarde sobre o herói do filme. Mesmo montado o tempo todo a cavalo, a legenda nacional insiste em chamar esse homem misterioso de “Motoqueiro” Fantasma, sendo que ainda demoraria mais meio século até surgirem os primeiros “cavalos de aço”. Em seguida, o filme dá um salto para vermos a origem do Motoqueiro da nossa época, modificando apenas um ou outro elemento dos quadrinhos. Johnny Blaze e seu pai, Barton, se apresentam em circos fazendo acrobacias perigosas com motos. Sabendo que o pai está com câncer, o jovem Johnny (interpretado por Matt Long, do seriado cancelado Jack & Bobby) faz um pacto com Mefisto para salvar a vida de Barton, apenas para vê-lo morrer logo em seguida num acidente durante uma apresentação. Mefisto, então, explica a Johnny que ele deveria ter lido as letras miúdas do contrato e que, de qualquer forma, agora está em débito com o senhor das trevas. Johnny fica amargurado com a situação (sejamos justos: quem não ficaria?) e cancela os planos de fugir para longe com sua namorada, Roxanne Simpson.
Anos depois, Johnny (agora na pele de Nicolas Cage) é o mais famoso acrobata motorizado dos Estados Unidos, arriscando sua vida em façanhas perigosas. Prestes a realizar a apresentação mais arriscada de sua vida, Johnny é surpreendido pelo reaparecimento de Roxanne, agora repórter de TV (e interpretada por Eva Mendes, de Era uma Vez no México). Mas as tentativas de reatar o romance terão um complicador: o maligno Coração Negro (o insosso Wes Bentley) aparece no deserto e, após matar todos os clientes de um bar de estrada, invoca três companheiros das profundezas do inferno para, juntos, acharem um pergaminho que lhes dará o poder de dominar o mundo. Como Coração Negro é o filho rebelde de Mefisto, seu pai se sente na obrigação de colocá-lo no devido lugar e convoca Johnny Blaze para a missão, conferindo-lhe o poder de usar o fogo do inferno e usar a moto mais cool do mundo. Há, claro, o problema de se transformar numa caveira em chamas enquanto o poder está em uso, mas Johnny não parece se importar muito com isso, pois logo sai por aí enfrentando ladrõezinhos baratos, destruindo propriedade alheia e enfrentando os capangas super-poderosos de Coração Negro.
Quem assistiu à bomba, o Demolidor, estrelado por Ben Affleck, escrito e dirigido pelo mesmo Mark Steven Johnson, já sabe o que esperar. Ou melhor, o que NÃO esperar: roteiro coerente, cenas emocionantes, piadas divertidas e boas interpretações. Quer exemplos?
O acidente no qual o pai de Johnny morre é tão simplório que fica difícil acreditar que tenha sido fatal; dá impressão que ele morreu mesmo foi de tédio. Não se explica direito porque o tal pergaminho, ao qual estão presas mil almas condenadas, é importante para a dominação do mundo. O salto teoricamente perigoso e emocionante do herói em sua última apresentação é dado com uma facilidade quase leviana. As lutas do Motoqueiro com as entidades malignas são pouco ou nada emocionantes. A edição do filme peca constantemente, deixando algumas seqüências com conclusões apressadas demais e iniciando outras do nada, sem mostrar uma ligação com o que estava sendo mostrado. E Cage, geralmente um ator competente, está careteiro e exagerado no papel. E o penteado estranho que ele usa para tentar esconder a careca também não ajuda.
Apesar de tudo, há coisas positivas. Os efeitos especiais são bacanas e dão vida àquilo que sempre pudemos ver apenas nos quadrinhos, inclusive nos momentos em que o personagem passa de moto à alta velocidade, causando danos a carros estacionados e derretendo o calçamento. O roteiro parece tentar seguir uma estrutura de faroeste, não apenas colocando o Texas como cenário do filme, mas também mostrando vilões vestidos com longos capotes, um mocinho tentando vingar a morte do pai, um mentor mais velho que ajuda o herói antes do duelo final e outras coisas, que acabam conferindo um certo charme ao filme. Também foi bacana a idéia de colocarem, como Mefisto, o ator Peter Fonda, que se tornou ele próprio um ídolo dos motociclistas do mundo todo quando estrelou o clássico Sem Destino, em 1969. Outra presença que acaba emprestando alguma nobreza ao filme é a de Sam Elliot, de O Incrível Hulk e Obrigado por Fumar, como um coveiro misterioso que aparenta saber mais do que deveria.
O Motoqueiro Fantasma nunca foi um herói do primeiro escalão da Marvel (já teve sua série descontinuada mais de uma vez), mas tem uma grande quantidade de fãs e um universo interessante. Por isso mesmo, merecia um destino melhor nos cinemas. Contudo, apesar das críticas negativas generalizadas, o resultado nas bilheterias tem sido bom o bastante para o diretor começar a falar numa continuação. Quem sabe na próxima eles acertam já que, fato incontestável, o Motoqueiro é melhor que Demolidor e muito, muito melhor do que a Elektra, que Johnson também roteirizou. Talvez, se ele vender sua alma ao diabo, consiga fazer um bom filme um dia.
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