Os Incríveis
Nota: 8
Na fila do cinema, uma pessoa pode virar para quem estiver saindo da sala onde acabou a sessão de Os incríveis (The incredibles, 2004) e perguntar: "E aí, é melhor que Shrek 2?"
A questão não é totalmente errada, afinal estamos falando de dois longas-metragens construídos a partir de pixels e em empresas que nos últimos anos vêm brigando quase que sozinhas nos mercados de animação para o cinema. A segunda aventura do ogro verde, por exemplo, tem a melhor arrecadação nas bilheterias deste ano, e como Monstros S.A. foi o rival direto de Shrek em 2001, era de se esperar que Dreamworks e Pixar travassem mais uma batalha.
Mas a verdade é que Os incríveis não deve ser comparado a Shrek 2. O verdadeiro rival da família formada por Sr. Incrível, Mulher-Elástica, Violeta, Flecha e Zezé é o nosso amigo da vizinhança, o Homem-Aranha. Desta vez, a empresa presidida por Steve Jobs, que também é o chefão da Apple, deixou para trás as comédias "fofinhas" com brinquedos, insetos, monstros bonitinhos e peixes palhaços e entrou de cabeça no mundo dos super-heróis.
Quando conhecemos os personagens principais, eles estão no auge de suas carreiras de salvadores do mundo, vivem na mídia e trabalho é o que não falta. Mas após um incidente com uma das pessoas em perigo, os heróis começam a ser alvo de processo em cima de processo. O governo então cede à pressão popular e acaba proibindo a ação de superseres - o que nos faz lembrar de uma outra HQ, Watchmen, de Alan Moore.
Quase tratados como bandidos, os heróis têm de mudar de emprego e, claro, de vida. Há um projeto que os recoloca no mercado de trabalho "normal" e é num destes escritórios chatíssimos cheio de trabalhos burocráticos que Beto Pêra, alter-ego do ex-Sr. Incrível, vai parar. Agora casado com Helen Pêra (Mulher-Elástica), ele tem três filhos, vive no subúrbio e trabalha numa seguradora, onde seu chefe não perde a chance de gritar com ele.
Completamente insatisfeito com sua vida, Beto vê sua vida dar uma nova guinada quando recebe um estranho chamado para voltar a atuar, desta vez, em missões secretas e para um novo chefe mais secreto ainda. Faturando alto e se divertindo muito por ter as explosões e perigos de volta à sua vida, ele se sente renovado ao ser novamente o Sr. Incrível. Mas este sentimento não dura muito e logo ele se mete numa enrascada sem tamanho que só sua esposa e seus filhos - que nunca haviam usado seus poderes com força total - podem salvá-lo.
Apesar de não utilizar as texturas que foram desenvolvidos para fazer os pêlos azuis de Sulley ou o mar das aventuras pela busca de Nemo, animar Os Incríveis não foi tarefa fácil. Desta vez, os artistas da Pixar ralaram muito e pela primeira vez fazem um mundo próximo da nossa realidade. Um dos truques para não cair na mesma armadilha que gerou críticas ao hiper-realista Final Fantasy e mais recentemente ao Expresso Polar, foi a utilização de personagens mais próximos da caricatura que da realidade... pelo menos no traço, já que psicologicamente todos eles têm bastante profundidade. Para citar apenas dois deles, vale notar que o poder de invisibilidade de Violeta é uma metáfora para o que muitas adolescentes querem: ser invisíveis, sumir de tão tímidas. Já a supervelocidade de Flecha, representa o estado de um garoto de 10 anos, que não consegue ficar parado.
Já as melhores piadas vêm da impotência dos heróis quando estão longe de seus trajes colantes, ou agindo humanamente na pele dos super-heróis. Entram nestes casos a cena de Beto fechando a porta de seu velho carro com força e fúria do Sr. Incrível e até mesmo o momento quase traumático em que a Mulher-Elástica olha para o tamanho do seu traseiro antes de sair para a salvação de seu marido.
Mas apesar de ter conseguido equilibrar muito bem todos estes elementos humanizadores e ainda incluir na história ação de primeira com perseguições de carros, explosões e pancadarias, o diretor Brad Bird (que fez ótimo O gigante de ferro, 1999, e aqui empresta sua voz à Edna Moda na versão legendada) não conseguiu fazer um filme perfeito... pelo menos não para os padrões da Pixar. Antes de iniciar o filme, é mostrado o curta Boundin' (sobre uma ovelha que é tosada e acha que perdeu sua alegria), mas ao fim de Os incríveis não há as já famosas "piadinhas nos créditos" que acompanham os longas da casa desde Vida de inseto. É uma pisada na bola pequena perto de todos os outros acertos, mas a culpa é toda deles, que nos deixaram mal acostumados.
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