Vermelho Como o Céu
Nota: 9
Não é difícil entender o porquê da seleção de Vermelho Como o Céu (Rosso Come Il Cielo, 2005) como o melhor filme de ficção na 30ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo no voto do público. O longa reúne elementos de fácil apelo, já bastante testados e aprovados pelo público, de enorme aceitação. Trata-se de um drama de superação baseado em fatos. E com crianças. E sobre cinema! É a trifeta do sucesso-família.
Isso não significa, porém, que se trata de um filme a ser execrado ou evitado. Pelo contrário. Os tais elementos, reunidos pela mão habilidosa do cineasta Cristiano Bortone, tornaram-se matéria-prima para uma obra sensível e com potencial para ser bastante lembrada e querida.
O diretor conheceu Mirco Mencacci, personagem principal da história, quando eles trabalharam juntos em Sou Positivo (Sono Positivo), longa que o cineasta lançou em 2000. Mencacci é cego desde a infância e atualmente um dos editores de som mais respeitados da indústria cinematográfica italiana. Ao saber da história de vida do profissional, deve ter parecido um desperdício a Bortone não realizar Vermelho Como o Céu. É praticamente um filme pronto.
Depois de um acidente no início da década de 1970, o toscano Mirco (vivido com intensidade por Luca Capriotti), aos oito anos, começou a perder gradualmente a visão. Além das brincadeiras infantis, as maiores perdas imediatas foram o cinema - que o garoto adorava - e a escola, já que o governo italiano na época não permitia que deficientes visuais dividissem as aulas com alunos "normais". Assim, ele é enviado a um tradicional instituto para meninos cegos em Gênova. E é lá, em meio à repressão da visão retrógrada sobre sua condição, que ele descobre sua vocação.
A história tem lá seus excessos (a manifestação parece um tanto atropelada, sem desenvolvimento), previsibilidades (o final é anunciado 10 minutos antes de acontecer) e personagens falhos (o diretor do instituto principalmente), mas no geral é mesmo cativante. O elenco de meninos - em sua maioria deficientes - é encantador. Simone Gullì, que vive o bonachão Felice, é um achado, bem como o protagonista, Capriotti.
E como não poderia deixar de ser, a edição de som - que curiosamente não tem a participação de Mirco Mencacci - é primorosa. As cenas de exploração sonora são excelentes e poéticas, captadas com tecnologia de ponta e cristalinas. Em determinados momentos, dá até vontade de fechar os olhos e "ver" o filme como seu personagem principal.
A questão mais estimulante com que se defronta o cineasta é: como filmar os sons? Por meio desse desafio o espectador é levado a questionar a uniformidade do mundo das imagens, do qual nos tornamos reféns. Pois, em vez de fetichizá-las, como no cultuado Cinema Paradiso, Vermelho desconstrói seu mecanismo, demonstrando, por meio dos sons, como se constitui a ilusão. Desse modo, o que oferece é uma lição plena de sentidos.
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