Time
Nota: 7,5
As primeiras imagens de Time - O Amor contra a Passagem do Tempo são de uma cirurgia plástica, na linha "embrulha estômago" da série Nip/Tuck. O diretor coreano Kim Ki-duk não é nem um pouco sutil ao discutir a questão da busca pela aparência perfeita e tudo decorrente daí - o culto à imagem, o interior versus o exterior etc.
O filme versa sobre uma garota que faz uma operação para mudar seu rosto, já que acha que seu namorado está enjoado dela. Não avisa ninguém, some por seis meses, adquire nova identidade e vai (re)conquistar o amado. O estranho é que, com tanta "sutileza" oriental, o diretor consegue ser grosseiro, ou melhor, aproxima-se do didatismo das telenovelas. Em alguns momentos, no entanto, cria boas idéias, ao mostrar como, no desespero, procuramos o rosto do ser amado em qualquer pessoa, como não sabemos mais quem somos em certo ponto da relação.
Ki-duk fica, assim, apenas perto do seu tema de "autor": uma discussão sobre a passagem cíclica do tempo, o eterno retorno, a ausência e incompletude como fardos da vida.
Em Time, as mesmas questões vêm embutidas já no cerne. A superficialidade, o tempo que não corrige defeitos e a ilusão de ótica são coisas indissociáveis para quem procura no diretor a tal renovação que representa o cinema sul-coreano. Kim Ki-duk é a traseira da produção local, justamente a que mais desembarca no Brasil.
Ele é o diretor coreano mais conhecido no ocidente – o que não quer dizer que seja o melhor ou o mais original, apenas o que consegue maior aceitação por parte do público e também dos distribuidores e dos curadores dos grandes festivais - e parece ter recobrado um pouco a consciência, após o atentado à inteligência e ao bom senso com que ele danificou sua carreira: O Arco.
Realmente há de se considerar que ele não angaria a simpatia ou compreensão de parte da crítica desde sempre, o que faz com que alguns indiquem o filme O Arco como uma continuação natural de uma carreira desastrosa e enganadora. Não me estenderei, no momento, a respeito dessa controvérsia de opiniões, mas deixo claro que mantinha o diretor em alta estima até bem pouco tempo – dúvidas surgiram com Primavera, Verão..., e um terror se abateu sobre minha cabeça com a produção citada acima.
Temos agora à mão uma nova possibilidade de avaliar e tentar definir com mais segurança o diretor: Time - O amor contra a passagem do tempo . Temos? Mais ou menos. Kim Ki-Duk retoma muitas de suas repetições, estilos e símbolos nesse filme. Estão lá o conflito eterno - embora não ostensivo ou aparente – que faz da coreana uma civilização à parte quando comparada às outras da região, com seu comportamento anormalmente agressivo e expansivo em contraste com momentos de serenidade zen (país de formação cristã e budista é uma boa tentativa de explicação); o estilo de montagem com algumas pequenas elipses – trata o tempo de maneira particular -; o amor num eterno processo de tortura mesclado ao prazer e resoluções inusitadas se observadas por padrões “comuns” de compreensão. É mais ou menos isso. Time nos traz um diretor que se repete mas que tem algo a dizer.
Time fala de pessoas insatisfeitas consigo mesmas e, conseqüentemente, com sua relação amorosa, encontrando como possível solução para tais dilemas a transformação física, que traz a reboque, evidentemente, toda uma reestruturação psicológica – como se realmente acreditassem na sua transformação em outra pessoa. Evidencia as reações extremadas – explosões temperamentais, ciúme doentio e sem razão e a agressividade física de seus personagens, que se comportam durante todo o filme como dispostos, a qualquer momento, a cometer um suicídio ou um assassinato, por amor. E cria momentos de ações, que se aproximam de um modo budista de observar, de cercar, de não aparecer, mas com evidentes dicas de que alguma presença está de soslaio – momentos em que o filme quase se veste de aura espiritual.
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