O Jardineiro Fiel
Nota: 8,5
Depois de alcançar grande sucesso internacional com Cidade de Deus (2002), Fernando Meirelles foi convidado a dirigir uma produção estrangeira, O Jardineiro Fiel (The Constant Gardner, 2005). Ele entrou para substituir o inglês Mike Newell (Quatro Casamentos e um Funeral, O Sorriso de Mona Lisa), que acabara de ser contratado para dirigir o quarto Harry Potter. Com a mudança, a pegada sentimentalóide que Newell possivelmente imprimiria ao longa ficou em segundo plano. Com Meirelles, a adaptação do romance de espionagem de John Le Carré fica mais fiel ao original: carregado de suspense, tensão e crítica sociopolítica.
Tessa (Rachel Weisz) é uma fervorosa defensora dos direitos humanos. Ela conhece o diplomata Justin Quayle (Ralph Fiennes) em um pronunciamento feito por ele na ONU. Ao questioná-lo de forma passional sobre a participação da Inglaterra na guerra do Iraque, Tessa se excede. Isso aproxima os dois, que acabam iniciando um relacionamento. Ao saber que Justin seria transferido para África, pede para ir junto. Lá, se envolve nos problemas de saúde do Quênia e, junto com o médico Arnold (Hubert Koundé), descobre uma manipulação farmacêutica de interesse econômico que pode estar matando a população. No caminho de sua investigação, a convicta Tessa termina encontrando a morte. Justin, até então o pacato e alienado diplomata interessado em botânica e jardinagem, resolve descobrir o que existe por trás - e há muito - do assassinato de sua esposa.
A parte técnica do filme se faz notar. A câmera age como se fosse um personagem. Às vezes, ela entra apressada, nervosa. Espécie de terceira pessoa na ação, em busca de um melhor ângulo de visão, passeia entre os atores e objetos em cena, até encontrar lugar que a satisfaça. A edição também contribui nessa agilidade, pontuando os flashbacks com o momento real. Adicione o visual saturado do diretor de fotografia César Charlone, o mesmo de Cidade de Deus, e tem-se uma estética muito parecida com a do filme brasileiro.
Esta plasticidade do cinema de Meirelles - ou seriam cacoetes? - anda livremente pelas favelas do Quênia e carrega o filme de urgência. São imagens coloridas, granuladas, que contrastam com tamanha pobreza e sofrimento. Ocorre o inverso nas cenas filmadas na Europa. O ambiente é opaco, acinzentado, depressivo. Todos estes elementos ajudam o espectador a entender o amor que Tessa sentia pela África. A música de Alberto Iglesias, responsável por ótimas trilhas dos filmes de Pedro Almodóvar, também colabora para criar o clima poético necessário para se entender como a relação de Tessa e Justin, que começou por acaso, tornou-se tão forte.
A história de Le Carré roteirizada por Jeffrey Caine, caso fosse filmada por Newell, certamente valorizaria mais o lado romântico. Ralph Fiennes e Rachel Weisz são técnicos o bastante para carregar a trama. É difícil saber como seria o resultado, mas é fato que Meirelles soterra um pouco a dramaturgia debaixo dos seus carregados maneirismos. O filme parece ter sido encomendado para faturar premiações. Existe toda uma campanha imbuída nesse objetivo - e não será surpresa nenhuma se vier o aval do Oscar nas categorias principais.
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