09 junho 2005

Tentação



Nota: 7

O relacionamento amoroso entre homem e mulher continua sendo um mistério, uma loteria. Como explicar que aquela paixão, a chama do amor, vai apagando com o tempo? Às vezes o sentimento acaba para ambos os lados, mas ninguém tem coragem de declarar o fim. Ainda pior é quando só um continua amando. Tentação (We don't live here anymore, 2004) lida com todas essas possibilidades. Não à procura de soluções, mas sim incitando o espectador a uma reflexão. Por isso é quase que impossível não se identificar com certas atitudes e acontecimentos mostrados.

Toda a narrativa é concentrada no convívio entre dois casais. Jack (Mark Ruffalo) e Hank (Peter Krause) são melhores amigos. Suas esposas, Terry (Laura Dern) e Edith (Naomi Watts), são mães de seus filhos e suas amigas também. Eles moram em boas casas, têm bons empregos e se vêem sempre. Mas por trás dessa relação perfeita Jack está tendo um caso com Edith. A cada momento que pode, ele inventa uma desculpa para se encontrar com ela. Terry está desconfiada e aflita, pois ela ainda ama seu marido e seu maior desejo é que as coisas voltem a ser como eram.

No meio desse emaranhado, Hank só tem tempo para o seu trabalho. Seu único objetivo é conseguir publicar seu romance. Sua obsessão é tamanha, que o sexo tornou-se um simples desejo carnal, porém, na forma de adultério. O interesse sexual e sentimental por sua esposa, Edith, praticamente sumiu. A trama vai se desenvolvendo mostrando que traidores e traídos são vítimas de seus próprios desejos. A verdade está mais próxima do que parece. É muito tênue a camada que separa o que está realmente acontecendo ao redor dos personagens. Na verdade eles sabem, mas encarar a realidade significa destruir suas rotinas. E nesse ciclo tedioso o casamento não é tratado com nobreza por nenhuma das partes. O envolvimento espiritual não acontece, restando só as vontades pessoais e mesquinhas.

O roteiro de Larry Gross é baseado em dois pequenos contos de Andre Dubus (1936-1999). E o que mais instiga o espectador é transportar para os dias de hoje uma história que seria normalmente retratada na época renascentista. A sociedade moderna não está tão longe das tragédias românticas do passado. A grande diferença é a ausência de heróis ou confrontos. O diretor John Curran embarca na onda de Dubus em que os laços do matrimônio se esfiapam nos pequenos detalhes. Seu trabalho é enxuto e preciso. Ele aproveita ao máximo as qualidades do elenco, deixando que cada característica e nuance se apresente no momento certo, com a carga dramática exata.

O único defeito é a péssima escolha do nome do filme aqui no Brasil. A tradução literal de 'We Don't Live Here Anymore' é 'Nós Não Moramos Mais Aqui'. Um nome que possui um significado metafórico. Essa definição, além de intrínseca, mostra que apesar de presentes, a identidade dos personagens se encontra cada uma em uma dimensão própria. Bem diferente de ‘Tentação', que só serve para transmitir uma idéia errada sobre a proposta do filme. Com esse título, o espectador desavisado pode deixar de aproveitar um filme introspectivo, por achar que é mais uma bobagem comercial.