04 abril 2005

Robôs



Nota: 6

Quando dirigiram A era do gelo (2002), Chris Wedge e o brasileiro Carlos Saldanha tiveram que maneirar nos pincéis. Afinal, o Pleistoceno, período quaternário do Cenozóico, não era exatamente um tempo de muita poluição visual, se é que você me entende. Portanto, nada melhor para aplacar essa sede de imaginação do que situar o projeto seguinte, Robôs (Robots, 2005), no futuro. E acredite, a dupla forra todo fotograma com o máximo de formas, cores e informações possíveis.

A excelência estética do longa e o frenesi das cenas de ação compensam as obviedades do roteiro. Rodney Lataria (voz de Ewan McGregor no original e Reynaldo Gianecchini em português) cresceu numa cidadezinha de interior. Filho de um lavador de pratos, só conseguia peças de segunda mão para as suas "atualizações de idade". O jovem Rodney sonhava conhecer Robópolis, a terra das oportunidades onde o inventor Grande Soldador (Mel Brooks), ídolo de todos, dizia que "todo robô pode brilhar, não importa do que seja feito". Uma espécie de Silvio Santos robótico, símbolo do sucesso capitalista. Não do ponto de vista da elite, mas sim do povo. O trabalhador que deu certo e incentiva outros a chegar lá. Mesmo o desenho assumindo-se anti-consumista, não consegue fugir do paradoxo.

Sozinho na metrópole, Rodney percebe que não é bem assim. Dom Aço (Greg Kinnear) aposentou Grande Soldador do comando da empresa e agora lidera uma renovação no mercado. A elite toma o poder. Peças de reposição não serão mais fabricadas, só produto de primeira linha. Quando o herói descobre que a maioria dos robôs não tem como sobreviver à reciclagem, inclusive o seu pai, decide enfrentar Dom Aço em nome dos ideais do velho Soldador.

Reveste-se de crítica ao consumismo, assim, a clássica história do Bem contra o Mal, da pureza interiorana contra a selvageria da cidade, da maioria negligenciada contra a minoria corporativa. Cientes de que essa trama batida ainda rende bom caldo, Wedge e Saldanha não se acanham em acrescentá-la de arquétipos: o herói esguio com o seu par romântico, o gordinho desengonçado e, claro, o tagarela do alívio cômico - cuja dublagem eficiente de Robin Williams tende a se perder por aqui.

A utilização desse formato edificante, mais fácil de compreender, se legitima na medida em que Robôs é um desenho feito para crianças, de verdade, numa indústria que tem medo de se assumir juvenil. Os pequenos devem aproveitar apenas o desbunde visual em sua plenitude frenética, pois não encontra-se a crítica que existia em Vida de Inseto, por exemplo. Resolveram dar uma de tio Walt e ensinar "boas lições" para as crianças, passar uma moral da história. Enquanto no nível digital o desenhos estão progedindo cada vez mais, no nível crítico o descenso é evidente.

Resta aos maiores se divertirem com paródias de O Senhor dos Anéis e Star Wars. Mas a idéia principal não é essa, definitivamente. Quando tenta soar adulto, Robôs esbarra no anacrônico (a referência a Cantando na Chuva sequer rende versos decentes) e no desgastado (se zoar Britney Spears já não funciona tanto, imagine então fazer piada com flatulência). Do anti-consumismo ao progresso... não deixa de ser melhor que as "fábulas" disneynianas, mas não deixa de ser o outro lado da moeda.