Confidencial
Nota: 5
Já que as comparações são inevitáveis, vamos a elas. Realizados quase simultaneamente, Capote (2005) e Confidencial (Infamous, 2006) contam exatamente a mesma história: como o escritor Truman Capote dedicou-se durante seis anos à criação de sua obra-prima, À Sangue Frio (In Cold Blood), um dos maiores romances do século XX e precursor dos livros-reportagens (obras que empregam técnicas narrativas da ficção em histórias verdadeiras, pesquisadas como notícia).
A história começa em 15 de novembro de 1959, quando Capote lê no jornal uma pequena nota sobre o assassinato dos quatro membros da família Clutter, encontrados mortos na sua casa em Holcomb, Kansas. O escritor empolga-se - como uma cidadezinha interiorana, povoada por vizinhos de longa data, que se conhecem e confiam uns nos outros, está recebendo essa notícia, já que o assassino pode ser qualquer um? - Capote faz as malas e parte em direção ao oeste, farejando uma história e incapaz de prever seu dramático desfecho.
Enquanto o filme de 2005, Capote, é mais distante e calculado, Confidencial mergulha nas emoções de seus protagonistas. As abordagens refletem as origens dos roteiros. O primeiro veio de uma biografia austera de Gerald Clarke, o outro de um livro criado a partir de relatos (e fofocas) de pessoas que conheceram Capote, de George Plimpton. Apesar de se vestirem igual, falarem com a mesma voz irritante e terem os mesmos amigos e idéias, os dois Capotes não poderiam ser mais diferentes. O vivido por Philip Seymour Hoffman em 2005 é mais reservado, esconde suas cartas e um inteligente oportunista. O interpretado por Toby Jones aqui é um homem espirituoso, dividido, ligado ao seu "personagem" de À Sangue Frio por afeto e um passado de desgraças.
Tecnicamente, Capote é um filme melhor. O registro metafórico do Kansas, a transformação de Hoffman no escritor, o favorecem (o mirrado e naturalmente esquisito Jones não precisou de muita transformação para ficar perfeito). Mas Confidencial não fica tão atrás. Ao optar por uma aproximação menos mítica do autor - e muitas vezes bem-humorada -, ele facilita o relacionamento com o público com essa estranha figura. Outro grande trunfo do segundo é o elenco reunido pelo diretor Douglas McGrath (Emma, O Herói da Família), que inclui Sandra Bullock, Sigourney Weaver, Isabella Rossellini, Jeff Daniels e, especialmente, Daniel Craig. O novo James Bond rouba todas as cenas em que aparece, mostrando que Capote deveria ter investido em um ator melhor que Clifton Collins Jr. para o papel de Perry Smith, um dos dois assassinos da trama. Craig é intenso, inteligente, terno e, em alguns momentos, até assustador.
McGrath foi feliz também na utilização de trechos de entrevistas com os personagens, que parecem extraídas de um talk-show póstumo. A solução, entremeada com as seqüências encenadas, reforça o tom humano que o filme almeja, dando um lado quase documental a ele - certamente uma técnica interessante para injetar alguma novidade num gênero já bastante explorado, e ao mesmo tempo uma homenagem ao próprio pioneirismo da obra que o inspirou.
Mas qual seria o filme mais verdadeiro então, Capote ou Confidencial? Impossível saber, mas ambos merecem ser conferidos - ao menos como um exercício de cinema, provando como o olhar dos criadores pode alterar dramaticamente a mesma história, com resultados tão distintos quanto interessantes.
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