Questão de Imagem
Nota: 8
Por que todos acham que os gordinhos são sempre mal amados? Questão de Imagem (Comme Une Image, 2004) aborda esse assunto, mostrando que para a maioria das pessoas, apenas a aparência exterior é o que conta. A sensibilidade do cinema francês em “tocar” certas feridas de maneira sutil é sempre uma experiência interessante. Premiado em Cannes 2004 pelo roteiro, a diretora Agnès Jaoui repete o mesmo estilo de seu filme anterior, O Gosto dos Outros (2000), que ganhou os César (Oscar francês) de melhor filme, roteiro e atores coadjuvantes.
À primeira vista, a motivação da personagem principal parece bastante clichê. Lolita Cassard tem 20 anos, é gordinha, se acha feia e não consegue manter nenhuma auto-estima. À sua volta ela tem apenas sua família e o grupo de suas aulas de canto. Seu pai é Étienne Cassard, escritor de sucesso, egocêntrico radical, e que vive obcecado pelo pânico do envelhecimento. Ele tem como segunda esposa, uma mulher bem mais jovem e fanática pela aparência. Juntos, eles têm uma filha de cinco anos, que é controlada o tempo todo por sua mãe nas horas das refeições. A professora de canto de Lolita, Sylvia Miller, acha que a menina não tem talento. Ela é casada com um escritor, Pierre Miller, que em seu terceiro livro publicado busca o reconhecimento de seu talento. Uma rede de relações complicadas arma-se a partir do momento em que a professora de canto de Lolita descobre que ela é filha de Cassard, seu escritor favorito, e que poderia ajudar na carreira do marido.
O filme trata das relações humanas. Basta olhar com um pouco mais de atenção, para perceber como são ricos os personagens. Todos são carregados de particularidades e emoções. Lolita não se sente amada pelo pai e, para chamar sua atenção, se torna uma adolescente em constante estado de irritação. Para ela, sua principal rival é a madrasta e quando esta larga seu pai, sua felicidade é completa. Ao mesmo tempo ela odeia ser filha do famoso Cassard, pois sabe que muitas pessoas só se aproximam dela por causa disso. Ela própria não acredita que pode ser amada apenas pelo o que ela é.
Já Étiene Cassard parece colecionar pessoas por diversão. Desde o início do filme é clara sua posição egocêntrica. Ele se cerca e dispensa as pessoas conforme seu humor, mas no fundo não passa de um adulto inseguro. Fica perceptível sua fragilidade ao ser deixado por sua jovem esposa e parte em busca de abrigo junto à sua filha, a qual sempre ignorava. Com o desenvolvimento da história, alguns personagens evoluem, outros regridem e uns permanecem estáticos diante do enredo da história. Não há aquela redenção obrigatória dos filmes americanos. É apenas a história de pessoas comuns, seus sentimentos e interesses ocultos.
As cenas são acompanhadas de uma eclética trilha musical - pop, rock, clássico, canto lírico e religioso - que parece reafirmar a proposta da narrativa, a riqueza de emoções que compõe cada ser humano. Toda essa diversidade terá seu clímax numa reunião durante um fim-de-semana. O grande programa será a queda das máscaras, movidas por uma ironia feroz sobre o jogo de aparência dentro e fora da família. Nesse momento percebemos que todos são vítimas e culpados por alguma coisa. Como na vida real não existem inocentes.
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